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Guiné-Bissau

19 de março de 2018

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Estive em  Guiné-Bissau,  país  que está na costa ocidental da África, por uma semana. Foi pouco tempo.

Antes de ir, estudei. Comecei pela literatura  e pelo magnífico livro de Moema Parente Augel,    “O desafio do escombro” (Garamond, 2007), que me deu informações para  compreender melhor  a cultura da Guiné. Ela fala da história do país, da política, da literatura muito rica,  dedicando-se bastante à língua. A oficial é o português,  que se aprende na escola. Há, no entanto, o crioulo, ou a língua guineense, falada pela maioria das pessoas. E há ainda as línguas faladas no âmbito das etnias, que são muitas.

O crioulo é agradável de ouvir. Uma língua bonita. Quando falam entre eles, não dá para entender. É interessante que  não possamos entender o que guineenses conversam quando não estamos incluídos. Não me sentia mal por não estar incluída. No livro de Moema há vários poemas escritos em crioulo traduzidos para o português. São lindos. Há vários da poeta Odete Semedo. Segue um verso, transcrito de “O desafio do escombro”:

Sou parte desta natureza

Tão gasta

Desta face da terra

Tão frágil e vasta

Sou o rio que corre

Tropeçando em pedras e vales.

Em crioulo:

Ami i padas di es mundu

Ku gasta dja

Ami i un burdu di n tera

Ami i iagu ku na kuri

Ku na n baransa nas pedras.

Em Bissau falei e ouvi português, língua  aprendida na escola e usada nas comunicações oficiais. Fala-se bem a língua, mas com algum distanciamento, o que talvez transforme a emotividade das mensagens transmitidas.

Fiquei conhecendo a literatura de Abdulai Sila,  li seu romance “A última tragédia” (Rio de Janeiro, Pallas, 2011). Vi na internet que em Bissau entraria  em cartaz uma peça escrita por Abdulai (“Dois tiros e uma gargalhada”) e eu queria muito assistir, mas não deu: quando estreou, eu já tinha ido vindo embora. Uma viagem é feita também de lugares não visitados, de expectativas não resolvidas.

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No Museu Etnográfico Nacional de Bissau  aprendi sobre o pano de pente, tradicional. Presentear alguém com um pano é um ato de amizade e carinho. Comprei panos de pente em Bissau.  Aprendi que até amanhã significa para sempre, ou que não há para sempre além de amanhã (tive um pouco de dúvida sobre o alcance da expressão).

E na literatura aprendi uma palavra antiga com significado novo: mantenha. Vi essa palavra pela primeira vez no livro de Abdulai Sila, em que o personagem se apresenta: “Vim só falar mantenha rápido. Eu sou o professor da escola”. (“A última tragédia”, p. 109). E todos tem a sua tabanca, a vila para onde podem voltar, onde está sua comunidade.

 

***

 

Este blog que fala sobre Guiné-Bissau  é bacana:http://montedepalavras.blogspot.com.br/ .

E mantenha quer dizer cumprimentos: http://montedepalavras.blogspot.com.br/search?q=mantenha

 

 

E o Rio de Janeiro (2)

30 de setembro de 2012

Aconteceu de estarmos no Rio de Janeiro na época do Festival de Cinema (http://2012.festivaldorio.com.br).
Aconteceu de assistirmos Elefante Branco, com Ricadro Darín, de Pablo Trapero, diretor de Abutres, também.
Não gostei de Abutres, muito pesado.
Elefante Branco é pesado, mas de um outro jeito, não tem só cenas fortes. Os diálogos são bons, os personagens são complexos, têm conflitos que a gente compreende bem. Gostei. Não conhecia o grupo de rock argentino Intoxicados. O filme termina com a música Las cosas que no se tocan. Dá pra assistir no youtube. Muito legal.
Darín representa um padre. Fazia tempo não ouvia falar de padres e no filme há dois muito interessantes. Ele mesmo representa o Padre Julián. E Rérémie Renier representa o Padre Nicolás. Ele é obstinado pelo trabalho no Elefante Branco, construção imensa em Buenos Aires ocupada por grupos de pessoas bastante sofridas. Há traficantes, rixas entre grupos do narcotráfico, aquele mundo cão que a gente sabe como é ou deveria saber. E os padres tentam ajudar a comunidade, interferem para que as pessoas morem melhor, para que verbas sejam liberadas, essas coisas. E fazem, fazem, e o resultado é quase nenhum. Mas provavelmente tudo seria muito pior se eles não estivessem lá. Nicolás gosta de ser padre, mas também gosta de ser homem e envolve-se com a assistente social (Martina Gusman). Esse envolvimento é um dos pontos interessantes do filme. Darín já é mais convicto do celibato e da vocação.
O outro filme a que assisti foi Smashed, americano. Dirigido por James Ponsoldt, conta a história de uma moça alcoólatra (Mary Elizabeth Winstead) que começa um programa de recuperação. O filme é sobre a resistência que ela encontra para se livrar da bebida. Tem problemas com casamento, emprego, tudo. É verdade que o filme passa a mensagem de que o alcoolismo é muito ruim e prejudica as pessoas. Mas o alcoolismo é mesmo muito ruim e prejudica as pessoas. Então o filme é realista.
O filme discute as dificuldades que a pessoa que quer parar um vício encontra, dificuldades que estão nela mesma e nos outros.
O triste é que, muitas vezes, a família e os amigos não querem que a pessoa mude.
Isso acontece com pessoas que usam drogas, com pessoas gordas que querem emagrecer, com qualquer tipo de mudança.
Assistimos também A Partilha, com Arlete Salles, Susana Vieira, Patrycia Travassos e Thereza Piffer. A peça é dirigida por Miguel Falabella, que também escreveu o roteiro. Termina dia 30 de setembro. Que bom que consegui ver. Ri bastante e até chorei um pouco, no final. Quando percebi, estava chorando.
Já passei por partilha semelhante e é assim, mesmo, no fim a gente briga por coisas de valor sentimental e não econômico. No fim de tudo, a grande questão é: e quem vai ficar com o joguinho do Toddy?
O Rio de janeiro continua lindo. Sol, mar bravo em Ipanema, Sushi Leblon é um excelente restaurante japonês. O Bar Lagoa continua o bar Lagoa, comi salsicha e salada de batata, muito bom. O Gula Gula é legal, as sobremesas são bem atraentes (brownie com sorvete?).
Na praia, cada um vive como quer, quem vende esfiha se veste de sheik, tem massagem na praia, todo mundo é campeão e abençoado.
Tem muita praia bacana pelo mundo, mas duvido que exista uma como a de Ipanema: gostosa e divertida. Até leitor de Dostoievski eu vi. E o biscoito Globo é muito bom, doce ou salgado. Tinha esquecido do biscoito Globo.
Passeando por Copacabana, passei pelo Largo do Poeta. Fotografei. Não sabia desse lugar, não conhecia esses dizeres do poeta (precisa clicar na foto para ler a carta), nada sabia sobre Rei Alberto. Foi assim, passando, que eu vi.

E o Rio de Janeiro

27 de setembro de 2012

A Livraria da Travessa em Ipanema está mesmo lugar. Tem jeito de Livraria da Vila. A música era jazz. Procurei um livro específico, “Fotografia e Império: paisagens para um Brasil moderno”, de Natalia Brizuela (Cia das Letras Instituto Moreira Salles). Vi o livro no hotel e fiquei com vontade de ler. Tirei até foto de uma página que me encantou especialmente. E a foto. O olhar triste e sofrido da moça pregou em mim. Ela não imaginaria jamais que estaria conectada a mim e a tantas pessoas por essa fotografia.

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Scallops em Nova York, ceviche em São Paulo

14 de agosto de 2012

O restaurante  Balthazar, em Nova York,  é bastante popular.

Parece um bistrô,  a gente pensa que está em Paris. O cardápio é em inglês, mas em francês, também – difícil entender os nomes dos pratos.

O garçom não tem aquela paciência para explicar e eu não tenho aquela outra paciência para perguntar. E escolho pelo som, pela palavra: scallops. Penso em carne, escalopes, bifes finos com salada. Quando a gente viaja, pensa muito rápido, a palavra entra em uma língua e sai em outra, o cérebro processa a ideia em imagens e às vezes as sinapses se confundem.

Espero, comendo pão.

Espero, olhando as pessoas.

Espero.

E a carne vem redondinha, branca. Várias bolinhas de escalope. Experimento. Mole, macio. Parece peixe. Carne. Só que do mar.

Aí compreendo melhor: scallops são vieiras.

E a salada veio com milho e bacon.

Prato nada dietético. Gostoso, mas esquisito.

Vou fazer scallops domingo. Só penso neles. Ou nelas.

Encomendei as vieiras.

Vieram congeladas e procurei uma receita viável.

E olhei livros, revistas, internet.

Encontrei o ceviche.

E me lembrei dos vários ceviches que já comi no Suri, restaurante em São Paulo também bastante popular.

Olhando o pacote congelado, descobri que a peixaria enviou vieiras vencidas. Prazo de validade terminou em maio. Ainda bem que vi em tempo. Alertada por meu inconsciente aflito e preocupado.

Telefonei.

O moço foi rápido. Em uma hora as novas vieiras chegaram. Branquinhas e lindas. Muito melhores que as outras, estateladas no tempo.

Descongeladas, expremi uns doze limões e deixei.

Hoje cedo, coloquei leite de coco, tabasco, pimenta daquela vermelha que parece um pimentão pequeno, cebola roxa, um dente de alho diminuto – não gosto muito de alho-, coentro, cheiro verde, cebolinha e sal. E aquele leite ficou ali, com as vieiras, marinando, como se diz.

Essa é a primeira vez que escrevo sobre comida, sobre a execução de uma receita alimentar.

Quem diria. Vieiras. Minha preferência indicaria brigadeiro ou pot de crème. Scallops me trouxeram aqui.

Nova York (2)

1 de agosto de 2012

The  New York  Palace.

Por que esse hotel?

Porque foi bem avaliado no booking.com,  no tripadvisor.com e  outros semelhantes. Apresentado como hotel de luxo, estava  com preço bem razoável. E parecia impessoal.  E neutro. E me impressionei com as fotografias da sala de ginástica. E bem localizado, na Madison.

Perto da  5ª Avenida,  em frente à  Saint Patrick Church.  Reservamos apartamento em um andar   alto.

Foi bem melhor do que o esperado. O lobby é espaçoso, bom lugar para ouvir música, olhar as pessoas indo e vindo, concentradas em seus computadores. É isso que todos fazem por aqui e no mundo todo: olham telas de notebooks, Ipads, Iphones, Itouchs.

A sala de ginástica do Palace fica em um tipo de SPA, no 8º andar. É grande e há muitas esteiras, muitos transports, equipamentos para musculação consistentes e bem conservados. Os vestiários têm chuveiros fortes, toalhas e roupões brancos. Parece que há uma sauna. Que não experimentei. E muitas maçãs vermelhas estão oferecidas, para antes  ou depois do treino, ou da sauna, ou da massagem.

O serviço de concierge se destacou. Indica e reserva restaurantes, espetáculos, shows. As pessoas que trabalham ali são  bem informadas, telefonam prontamente aos lugares para saber mais; dá tudo certo e ninguém fica perdido. Quando concluída qualquer reserva, eles imprimem e aí a gente vai direitinho. E o que é melhor, quem reserva é o The  New York Palace  e as portas se abrem com  facilidade. Até ao  Public,  brunch de sábado sempre lotado, conseguimos ir.

Restaurantes legais: Fig & Olive (figos adocicados em saladas e pratos quentes), Aquavit Dining Room,  Balthazar (todo mundo indica), Bar Pitti (Village), Katz’s Delicatessen  (sandwich de pastrami, lugar confuso e popular, Harry e Sally se encontraram por lá). Que mais…

O Balthazar é bem recomendado e não mais caro que os outros. É informal,  principalmente na hora do almoço, ou à tarde. Fica  aberto a tarde toda.  Ouve-se jazz, lá.

Falando em jazz, fomos ao Blue Note ouvir Latin Side of Joe Henderson, por Conrad  Herwig, Ronnie Cuber & Joe Lovano. Nunca tinha ido ao Blue Note e poderia ter escolhido o Village Vanguard ou o Birdland. Quis ver o Blue Note, tenho muitos discos de vinil gravados lá. Comi lá uma  salada gostosa, antes do show. Sentamos em uma mesa grudada no palco e nunca vi músicos tocarem tão perto de mim. As mesas são compartilhadas, logo chegou um rapaz solitário e se sentou na nossa. Comeu um filé e tomou uma cerveja. E ficou no Iphone enquanto o show não começava. Ninguém mais fica sozinho hoje em dia. Aliás, vi pelo menos duas pessoas lendo livros de verdade, em Cafés. Mas só vi uma livraria.

Fomos ao High Line e depois ao Chelsea Market, Lobster Place.  High Line é um jardim suspenso plantado  em uma passarela elevada. Há galerias de arte nas ruas e o lugar ficou  na moda.  No mercado, sashimi, sushi e lagosta. Barato.  Bom. É um pouco confuso porque no mercado não há  janelas, é difícil encontrar lugar para sentar. Com paciência,  a coisa funciona e no fim compensa. Andamos à tarde às  margens do Hudson. Sol, moças de biquini, lendo. Casais dançando tango. Domingo é domingo em qualquer lugar.

Fomos ao Museu de História Natural. Lotado. Esqueletos de dinossauro para tudo quanto é lado. Não entendi bem se eram verdadeiros ou falsos. Ignorância minha, mas é que, embora o museu seja, sem dúvida, bacana, muita coisa é representação e não real, e aí fiquei  um pouco confusa. Na Patagônia os dinos são mais verdadeiros. Assistimos a um filme breve no planetário. Não posso ir a planetário que durmo. Cochilei um pouco. Acho essa história de big bang interessante, só que não fico muito envolvida. Já sei que sou, mesmo,  uma partícula do nada, a via láctea não me atrai tanto. Preciso me sentir importante.

Passando pelo Lincoln Center, resolvemos comprar ingresso para um espetáculo. Escolhemos War Horse. Embora muito premiado, é um pouco chato. Escolhemos esse porque era um musical e podia ser compreendido por toda a turma. Meu pessoal tem idades diferentes, nem sempre dava para conciliar interesses e possibilidades.

No Metropolitan,  um dos museus mais lindos do mundo, vimos muita coisa do Egito antigo. Ficamos um tempão  nessa parte e acabamos perdendo alguma coisa, porque ficar mais de 6 horas em qualquer lugar é desesperador.

Lá  está um Monet que eu amo, Regatta at Sainte – Adresse                                (http://www.metmuseum.org/Collections/search-the-collections/110001584).

Vi em 1997 e ainda bem que ele não entrou para a reserva técnica. Estava do mesmo jeito, até mais bonito.  Não sei por que não consigo me apaixonar por outros  trabalhos,  gosto de ver e rever os mesmos. Identificação. Familiaridade (tomávamos café da manhã no café Europa todos os dias e depois me lembraram  que as pessoas que atendiam falavam espanhol).

Andy Warhol, Nine Jackies, no Metropolitan (http://www.metmuseum.org/Collections/search-the-collections/210013901. O  rosto de Jackie minutos antes de ele ser assassinado.

Essa palavra, instante, define tudo. O tempo passa e é preenchido por inúmeros fragmentos de felicidade, de horror, de nada.

Em um momento estamos em viagem, na viagem, e depois ficamos com as lembranças esfumaçadas e os recibos de cartões de crédito e ingressos utilizados e folhetos, muitos folhetos. E fotografias.

Um click. O tempo para nesse click. Um click na entrada da Tiffany, um click ao lado de um Monet, de uma dançarina de Degas, uma figura magra de Giacometti. E depois estamos em casa.

Quando viajamos, levamos os guias, as sugestões de diversas pessoas. Algumas recomendações combinam com a gente, outras não. Isso só se descobre experimentando. Eu tinha listas de três amigos diferentes, mas perdi no aeroporto. Recuperei alguma coisa, não tudo. Tinha memorizado outras dicas e já sabia os lugares que queria rever, dos quais tinha gostado na primeira vez em que fui a Nova York, em 1997.  E há os lugares de sempre.

Muito de uma viagem é o que não se vê. O que se imagina. Os guias nunca são suficientes. Por isso não leio quase nada antes de chegar a um lugar. Mas gosto de escrever, depois, para organizar  a memória, registrar, construir uma narrativa. Com palavras.

Por último, neste post, quero dizer que vi um pedaço do Muro de Berlim em Nova York, na rua. Fiquei surpresa e, procurando, encontrei, na Wikipedia, a relação das cidades que receberam fragmentos do muro. Em Nova York há três, um deles este  que vi.

Nova York

27 de julho de 2012

Dez dias em Nova York. Hoje vou ao Blue Note assistir Joe Lovano. A cidade no verão é bem quente, mas não está tão quente. Fui ao Metropolitan, ao MoMa, ao New Museum, ao Whitney Museum. Queria ver as cenas do Edo de Hiroshige no Brooklyn Museum, mas não estão expostas. Muito de uma viagem é o que a gente quer ver e não consegue. As expectativas. Agora estou na loja NBC no Rockfeller Center. O imaginário de cada um. Quem se identifica com House, Simpsons, Dr. Who, fica horas. Não me identifico com ninguém. House até já acabou.

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Literatura de viagem em viagem

8 de junho de 2012

Ainda falando sobre  literatura de viagem, vi na livraria do aeroporto de Congonhas outro dia um livro que me interessou: “A construção do Brasil na literatura de viagem dos séculos XVI, XVII e XVIII”, de Jean Marcel Carvalho França, publicado pela José  Olympio.

Gosto de olhar os livros de livrarias que não frequento porque a forma como são expostos é diferente e isso modifica meu modo de olhar para eles. Percebo temas e autores que não perceberia normalmente. E foi assim que aconteceu.

Fotografei a capa para não  esquecer do nome – não comprei na hora porque minha bolsa já estava pesada.

As narrativas de viagem dessa época mostram um Brasil deslumbrante. O  livro se propõe a  investigar em que medida o discurso contribuiu  para a formação de uma identidade brasileira.

Terminada a minha curta viagem a Brasília, finalmente tenho o livro comigo. O rigor da pesquisa me chamou a atenção, os textos estão todos publicados na Parte II, a antologia das narrativas é bastante extensa.

Quando estive na Amazônia, fiquei encantada  com a exuberância da floresta. E, por isso, fui logo ler a parte do livro que trata da descoberta do rio Amazonas. Segue breve trecho de relato de William Davies: “Os homens trazem, também, enfiado em ambas as orelhas, um toco ou caniço, aproximadamente da espessura de uma pena de cisne e com cerca de meia polegada de comprimento; ornamento semelhante é colocado no meio do lado inferior. Até mesmo no osso do nariz eles metem um pequeno caniço, onde penduram uma pérola ou uma conta que cai diretamente sobre a boca e balança de um lado para outro enquanto falam – o que é motivo de grande orgulho e satisfação. Os seus cabelos são longos, mas, nas proximidades da orelha, há uma parte arrendodada que é cprtada bem curta, rente à cabeça- à semelhança do corte de cabelo de um monge” (p. 353, 354).

Literatura de viagem

3 de junho de 2012

Depois das câmeras digitais, fotografar ficou muito fácil.

Todo mundo tira foto de tudo e o risco de ser flagrado em uma situação incoveniente aumentou. Inconcoveniente pode ser quase tudo, desde uma dose de álcool a mais até uma gargalhada em local imporóprio, uma festa entre amigos ou entre inimigos, uma bermuda mais curta no facebook de um colega de trabalho. E se a pessoa não tem facebook e não quer estar na internet, azar. Não vê a própria fotografia na rede.

Todo celular tem uma câmera fotográfica. Todo mundo tem celular. E todo mundo fica clicando no celular durante almoços, festas, reuniões, jantares,  restaurantes,  cinema,  hospital,  enterro.

Não sei se isso é ruim ou não, o fato é que é.

Isso tem a ver com literatura de viagens porque os  escritos nas viagens, os diários, são complementados pelas centenas de fotografias. Os diários não acabaram porque a escrita é irresistível. Quem escreve, escreve. Escreve e fotografa, eventualmente, mas sobretudo escreve.  Quem sabe desenhar, desenha também.

Talvez o texto seja diferente. Mais curto.  Mais pessoal. Mais íntimo. Mais fotográfico.

Relatos de viagens existem há muito tempo. Pero  Vaz de Caminha relatou nossas terras, nossa natureza e nossos índios. Jean Baptiste Debret desenhou e escreveu “Viagem pitoresca e histórica do Brasil”. Os desenhos são perfeitos. Ele devia passar horas bordando os relatos. Parece que o tempo deles, naquela época, era mais longo.

Não tenho muita paciência para escrever  diários nas viagens  Às vezes, anoto os lugares que visito, as impressões que tive, se discuti com alguém ou não, não muito mais. Tem gente que escreve tudo, o relato é parte da viagem.

Os estilos são variados. Hoje escrevo sobre um dos livros de viagem que andei lendo.

– Apontamentos de viagem, Penguin & Companhia das Letras, J.A. Leite Moraes, publicado em 2011. A introdução é de Antonio Candido. Leite Moraes foi advogado, político, professor, jornalista, liberal, escritor. A viagem, de São Paulo a Goiás e depois a Belém do Pará, começou no fim de 1880. Transcrevo  parte da intodução de Antonio Candido: “O motivo da viagem foi, como vimos, a nomeação para o cargo de presidente daquela província central, de acesso muito difícil no tempo. A sua missão consistia em presidir as eleições de acordo com a nova lei eleitoral, conhecida na história como lei Saraiva, que modernisou e liberalizou a legislação, estabelecendo o voto direto por distritos, com um deputado para cada um” (p. 12).

Os tempos da viagem fluvial eram outros.

Olha só: “Neste dia, achei-me sempre sentado ao pé do leme, junto ao piloto, o prático basílio, no tombadilho, com a minha espingarda atravessada sobre o colo, e de momento a momento atirava ora um pato, ou uma marreca, ou uma gaivota, ou um mergulhão, ou um socó, ou uma arara, enfim todo pássaro que passava-me pela frente” (p. 90).

Literárias e Ubatuba

16 de maio de 2012

Literatura e Ubatuba têm muito ou pouco em comum. Passei domingo lá e o dia estava lindo de tão feio. Ninguém na praia. Quer dizer. Passou um carro na areia, uma caminhonete. Eu andando e aquele carro grande vindo na minha direção. É proibido, quis gritar. E se ele me atropelar? Não resisti ao pensamento. Fui para o canto. Primeiro para a beira, no mar. Depois para a beira, na grama. Ele continuou devagar. Mas que impulsos não pode ter  um motorista de caminhonete dirigindo na areia em uma praia longa e absolutamente vazia, com exceção de uma caminhante solitária? No dia das mães? Ficções.

E a Virada Cultural. Marcelino Freire e Evandro Affonso Ferreira na Casa das Rosas. Às 2 da manhã. Amigos. Divertidos. Profundos. Complexos. Literatura.

E Valter Hugo Mãe na Livraria da Vila, Fradique, 12 de maio.  Valter Hugo Mãe é legal. O discurso dele é sedutor. Fala bem, pensa bem, vai direto no coração. Atinge. Daniel Benevides, da Cosac Naify, ciceroneou, recebeu, coordenou, fez as perguntas. Ele é muito inteligente.

Leituras: Haruki Murakami. Minha querida Sputnik e Do que eu falo quando falo de corrida. Eu queria escrever como Murakami. Queria correr como Murakami.

Viajando nas Viagens de Gulliver

3 de abril de 2012

Resolvi encarar Viagens de Gulliver, de Jonathan Swift. Estou aqui com a edição Ediouro/Publifolha, 1998. A tradução é de Octavio Mendes Cajado e  há texto de Rui Barbosa completando tudo.

A narrativa é em primeira pessoa. O período das viagens: dezesseis anos e sete meses. Publicação do livro: 1726.

O narrador é sutilmente irônico, astuto observador e analista da política de seu tempo.  Escreve como se estivesse vendo o leitor e nos sentimos parte das histórias, visualizando Lilipute e seus diminutos habitantes, assim como Brobdingnag e seus gigantes. Ele visita outros lugares, mas ainda não fui a todos. Passa por aventuras e desventuras, é grande e pequeno, inocente e esperto, amigo e ladino.

Swift brinca com verdades e mentiras, ficção e realidade, com a verossimilhança. E brinca com a linguagem, inventando nomes esquisitos para pessoas e lugares onde as línguas são estranhas – e mesmo assim ele é bem sucedido ao aprendê-las – o suficiente para a comunicação.

Viagens de Gulliver é um livro sobre viagens fictícias e reais. Ele acredita nas viagens que fez. E nós também queremos ir a Lilipute, Laputa, Luggnagg. De navio.

Amazonas

23 de fevereiro de 2012

Passei uma semana no Amazonas agora no carnaval. Fazia tempo que queria conhecer a floresta. Primeiro, Manaus; depois, Anavilhanas.

Manaus é uma cidade interessante. Tem congestionamento, não é nada planejada, as construções parecem estão meio  amontoadas. Só que as pessoas são agradáveis,  a cidade vista do Rio Negro é linda, o encontro das águas é bonito e o teatro Amazonas é formoso demais. A cúpula colorida sobre a construção rosada encanta os olhos.

Na floresta,  fiquei no  Anavilhanas Jungle Lodge (www.anavilhanaslodge.com). Atendimento correto, adequado,  na medida certa. Passeios agradáveis, com alguma emoção (muito barco, muito rio). Apartamentos modernos, bonitos. Nunca pensei que tomar banho no Rio Negro fosse tão gostoso. Os guias são bacanas. E a comida é muito boa, sem temperos excessivos, variada e gostosa. Voltei bastante feliz. Voltaria muitas vezes para lá.

Ainda California: Carmel, Monterrey, Highway 1

14 de agosto de 2011

Depois de São Francisco, fomos a Carmel (Carmel by the sea), uma cidade onde nada está fora do lugar. Clint Eastwood foi prefeito lá e isso é o que mais se ouve quando se ouve falar de Carmel. As vitrines das lojas são lindas, objetos bonitos são dispostos de maneira muito organizada, sob iluminação adequada. Não há prédios, só casas com jardins coloridos, bem aparados. A praia parece selvagem, mas está ali no seu lugar, tranquila. Pena que não estava sol.
Em Carmel há muitos cafés e em um deles comi, pela primeira vez na vida, carrot cake. Foi engraçado porque eu tinha visto na internet um vídeo na TV UOL ensinando a fazer essa torta e aí eu vi e quis logo provar . É uma delícia, mesmo. Jantamos em dois restaurantes legais: Grassing’s e Nico Ristorante.
Fomos super bem recebidos nos dois. Nos EUA os garcons são super adequados ao estilo do lugar. Eles devem ter recursos humanos muito bem preparados para selecionar o pessoal. Cada restaurante tem o garçom perfeito pra ele: contido, se o lugar é mais formal; alegre, se é para crianças, ou se a comida é leve. E assim vai.
Carmel é muito perto de Monterey, onde está um aquário super mencionado nos guias de viagem. É bacana, mas não achei assim espetacular. Em São Francisco, já havíamos visto um aquário bonito na California Academy o Sciences (http://www.calacademy.org ), então não nos espantamos com o de Monterrey. O que nos agradou em Monterey foi o almoço no Bubba Gump, o restaurante do Forrest Gump. Vimos ali pela primeira vez, mas há deles em muitos lugares (http://www.bubbagump.com/locations). É prático, rápido, eficiente, os camarões são gostosos. As sobremesas são imensas. Uma de sorvete sobre um cookie gigante e macio é das melhores que experimentei.
As comidas chamam atenção nas viagens. Os momentos em que paramos de nos movimentar, em nos sentamos à mesa e descansamos para conversar e saborear são dos melhores. E os garçons são as pessoas com quem falamos sempre, se não temos amigos ou conhecidos. E os americanos fazem tudo para que nos sintamos bem. Se eles estão interessados na parte que lhes cabe no tanto que gastamos, não importa. É horrível chegar em um restaurante e ficar esperando horas para ser atendido, desconfiando se o serviço é ruim ou se eles estão nos discriminando por qualquer motivo. Isso não acontece nos Estados Unidos.
Encontramos nosso hotel no Hoteis.com. Pagamos adiantado, pela internet, e deu tudo certo. O hotel é acolhedor, com wireless free no apartamento, tem uma salinha, uma pequena cozinha, quarto e banheiro. O problema era que o banheiro tinha duas portas e ficava entre o quarto e a sala. Quem estava na sala não podia passar para o quarto sem passar antes pelo banheiro. Tudo o mais era confortável. O hotel chama-se Wayside Inn. Não é bem hotel, é um Inn, daqueles em que não há lobby ou áreas comuns.
De Carmel fomos, pela Highway 1, passando por Big Sur, até Santa Barbara. A viagem durou 1 dia, chegamos lá no fim do dia. Em Big Sur paramos, para o almoço, em um restaurante super famoso, Nepenthe, parecido um pouco como o Recanto Santa Bárbara, na Rodovia Tamoios, estrada que vai para Ubatuba. O garçom era muito falante, falava tudo como se estivesse dando aula, discursando. Um cara alto, interessado em falar sobre tudo com um tom sabido. Ele deu pra gente um menu comemorativo do aniversário do restaurante, com os pratos servidos na época. A comida é estilo natural, saudável.
Na estrada foi tudo bem. Poderíamos ter parado nas cabanas de Big Sur, visto lobos ou elefantes marinhos, poderíamos ter visto o Hearst Castle, mas não quisemos, queríamos chegar. A estrada é bonita. Mas não sei… gosto mais de estar nas cidades, e não de ir até elas. Cada um tem sua percepção específica dos lugares e, embora a estrada seja linda e tudo o mais, não me tocou tanto. E chegamos em Santa Barbara, em um hotel pequeno reservado pela internet, muito diminuto e longe da praia. Mas as donas – não sei se eram donas ou não – eram muito simpáticas, prestativas, quase amorosas. O hotel chama-se Agave Inn. O quarto era ótimo, grande, espaçoso, decorado com bom gosto. Mas o lugar era tão esquisitamente solitário e longe da praia que não deu vontade de ficar. Santa Barbara me pareceu um Guarujá, ou Santos. Não tive a menor curiosidade de conhecer e constatei que eu gosto mesmo é das cidades grandes.

Califórnia em julho

26 de julho de 2011

Estados Unidos. Em um primeiro momento a gente vê que os filmes americanos são reais. O cinema mostra quase tudo.
Depois de um tempo, dá um certo bode, uma chateação ouvir aquela voz artificial dizendo “sure”, ou “ok”, naquela entonação característica. Quando a gente tenta imitar, eles tratam melhor. Há muitas regras e alguns códigos de comportamento, eles são muito diretos. E são necessariamente gentis:”How are you today?” “Have a good day” “Enjoy the rest of your day!” É o tempo todo assim. Às vezes a gente até acredita que é sincero. De qualquer forma, é confortante. Em Los Angeles a cortesia é mais evidente. Depois, no fim da viagem, dá pra ver que muitos cumprimentos são sinceros, muitas pessoas são legais e eles se esforçam para agradar (será melhor se você tiver um ou mais cartões de crédito).
São Francisco é uma cidade bonita, não é muito grande. Tem umas áreas muito bem definidas. Fisherman’s Wharf tem barcos lindos no mar, hotéis (Sheraton, Marriott, Radisson), muitas lojas de eletrônicos para turistas (tudo meio esquisito), o Museu de cera, um gramado lindo de frente para o mar, uns piers para leões marinhos que não estavam lá na hora, frutas lindas pra gente comprar e comer com chocolate no Pier 39.
A loja de chocolates e sorvetes da Ghirardelli tem o melhor sunday do mundo, mas se você por acaso for em um domingo de sol, pode se preparar para um tempo de espera na fila: demora. Mas vale a pena. Eles não pensam duas vezes antes de entrar em uma fila que vale a pena. Ouvi em LA que lá eles ficam em filas por cupcakes.
Ripley’s Believe it or not! é um pequeno museu que mostra objetos, relatos, excentricidades colecionadas por Robert Ripley, um americano jornalista que viajou para muitos lugares distantes quando viajar não era muito fácil. Se você estiver com crianças, é um bom programa. Tive a sensação, naquele museu, do sonho americano, daquela ideia de que tudo é possível, se a gente acreditar e trabalhar pelo que quer. Não sei se é isso, é difícil fugir dos lugares comuns, nessas horas.
Fomos a ótimos restaurantes, em São Francisco. Um amigo nos indicou um vietnamita, The Slanted Door, muito gostoso (http://www.slanteddoor.com) Fica no Embarcadero (Ferry Building), um lugar bonito, perto do mar. Parece que de dia é mais divertido. Ali já deu pra perceber que o serviço, nos restaurantes, é muito gentil e prestativo. Eles são atenciosos.
As pessoas que trabalham, aquelas com quem a gente fala, são amáveis. É que a gratificação pode chegar a 20%, então elas se esforçam pra gente consumir e retribuir o bom atendimento.
São Francisco tem mar e muitas ladeiras. Em um dos dias almoçamos em um restaurante famoso, The Cheesecake Factory, no 8º andar da Macy’s, em Union Square (http://www.thecheesecakefactory.com). Uma moça brasileira trabalha lá e conversamos, foi legal. A comida é gostosa e as tortas, muito melhores. Cheescake de banana, de Browne, todas engordativas. Sentamos no terraço, foi muito bom.
Almoçamos também no Scoma’s (http:// http://www.scomas.com), que fica no Fisherman’s Wharf. O restaurante é tradicional e os pratos com frutos do mar são bons.
Fizemos um City Tour. Em um City Tour a gente tem uma ideia geral da cidade, passa pelos principais pontos. E assim vimos a Golden Gate pela primeira vez. Passamos por Haight Street, que tem um passado hippie muito forte, todo Janis, Grateful Dad, paz e amor. Hoje eles vendem camisetas manchadas, roupas usadas. Mas há lojas de vinil, lá. Voltamos outro dia e comprei 3 discos: trilha sonora de Bound for Glory, Jim Croce e Ry Cooder. Há centenas de discos super legais na loja. Foi a única loja de discos que vi nos Estados Unidos. Essa e uma que ficava na mesma calçada, de disco de vinil, também.
Ainda no City Tour passamos por uma praça onde ficam casas em estilo vitoriano, muito famosas, aparecem em várias fotografias da cidade (http://www.sanfranshuttletours.com/alamo_square.htm). Uma dessas casas foi cenário para aquele filme engraçado, estrelado por Robin Williams: Uma babá quase perfeita (http://www.movie-locations.com/movies/m/mrsdoubtfire.html). Os guias de viagem contam essas coisas, mas a gente só presta atenção lá, ou quando volta.
Tentamos ir ao famoso parque Muir Woods, mas só chegamos até Muir Beach. Muir Woods estava cheio, não encontramos lugar para estacionar o carro. É como ir ao Ibirapuera em um domingo de sol: não é fácil. Aí paramos na Columbus Avenue, almoçamos no Café Zoetrope, do Coppola, com endereço na Kearny St, pertinho da Columbus. Lá foram escritos os roteiros de filmes muito importantes. Foi emocionante almoçar ali, onde, disseram, foi criada a Ceasar Salad, que é muito boa, por sinal, assim como o tiramisu.

Buenos Aires

3 de agosto de 2010

Passei quatro dias em Buenos Aires em julho. O sol estava tão gostoso, esquentou o frio que fazia no inverno. Tive sorte porque é bom andar com sol, e andar foi muito do que fiz na cidade. Fiquei no Art Hotel, na Recoleta, na Azcuenaga. O hotel é pequeno, bem decorado, e alguns quartos têm balcão. O café da manhã é meio natureba, tem pão integral, frutas, ovos, tomates, queijos, avocado…Adorei comer avocados. O hotel não é caro e valeu ficar lá. Não indicarei lugares para compras porque não costumo comprar em viagens, perco a vontade, é esquisito. Gosto de comprar livros e discos, mas nada de roupas e artesanatos locais, uma ou outra lembrança e pronto. Jantei em um restaurante diferente, o Club del Progreso, muito pitoresco porque vimos um porco assado ser cortado inteiro com um prato em uma demonstração muito divertida de sua maciez. Há um caderno para os visitantes assinarem e vi que Ricardo Darin esteve ali. No Museu da Evita estão alguns de seus lindos vestidos e me espantei de ver como os sapatos tinham sido usados. Um moço culto e inteligente explicava muito sobre Evita a estrangeiros de língua inglesa e fiquei prestando atenção à sua empolgação ao falar de uma pessoa tão carismática e essencial à história da Argentina. E fui ao estádio de futebol do Boca Juniors, La Bombonera. Parecia um programa sem graça, mas no fim a guia que dava as explicações era muito engraçada e ri bastante, ela tinha jeito para aquele trabalho, incrível. E a estátua do Maradona que está é bem legal- eu gosto do Maradona, gostaria de tê-lo visto desfilar na 9 de julho, mas não foi dessa vez. Fui também à “Colección de Arte Amalia Lacroze de Fortabat”, em Puerto Madero. O edifício é maravilhoso, o espaço muito lindo, mas fiquei um pouco irritada com um dos seguranças que andava pela sala fazendo barulho e me desconcentrando. Parece bobagem, mas achei chato isso. Fui ao tango, à Esquina Homero Manzi. É um lugar turístico, mas não tão caro e o tango apresentado é muito rico, interessante, bem dançado. Jantei lá também, a comida é normal, nada de especial, mas também não é ruim e o programa foi ótimo no conjunto. Achei a feira em San Telmo um pouco chata. Estava cheia, as pessoas que expunham não eram simpáticas, não tive vontade de comprar nada. Um restaurante bom é El Palacio de la Papa Frita. O pudim de pão é uma delícia. Foi só o começo, volto lá qualquer hora, os argentinos são bem legais.

Brasília e Bob Dylan

1 de dezembro de 2009

Brasília e Bob Dylan têm alguma coisa em comum, pra mim. É que no avião ouço Bob Dylan e quando estou na capital geralmente estou sozinha e no hotel  sou eu mesma e nessas ocasiões geralmente  penso em algumas músicas vitais: Visions of Johanna, A simple twist of  fate , Like a rolling stone, Desolation row, Ballad of a thin man, Highway 61 revisited. Essas são as músicas que eu mais gosto. Gosto de Jokerman, também, mas Jokerman está em um cd que não ouço tanto. Ouço muito  Highway 61 revisited (1965), Blonde on blonde (1966) e  Blood on the tracks (1974).

Brasília é uma cidade da década de 60, foi inaugurada em 1960. Quando Bob Dylan gravou  Highway 61 revisited, a cidade tinha cinco anos. JK foi um presidente visionário, concretizou um sonho que parecia impossível. Em uma das vezes em que estive lá, comprei sua biografia. Está separada, vou ler antes da biografia de Walt Disney. Quando um lugar me impressiona, gosto de ler sobre quem o criou. Por isso tenho a bio de Disney, também.

E tenho livros sobre Bob Dylan, embora  ele não tenha criado uma cidade. Mas criou inúmeros espaços mentais e sonoros; ele construiu, com sons e palavras,  caminhos que levam as pessoas a assumirem identidades e diferenças. Para Bob Dylan, suponho, não existe a igualdade ideológica entre as pessoas. Penso que ao descobrir isso ele se desligou da tentação dos discursos políticos e ativistas. Não sei. Não gosto de teorizar, de estabelecer pensamentos dogmáticos. Ele também não. Em dezembro de 65, deu uma entrevista coletiva famosa em que  negou, ou ignorou, que suas canções pudessem ter mensagens. Para ele, não são folk songs,  considerando-se que ele mesmo definiu folk music “as a constitutional re-play of mass production” (Television Press Conference, KQED, em Bob Dylan:The essential interviews).

Mas o que Brasília tem com  tudo isso? Tem no meu espaço mental. A cidade é aquele branco que fica separado de tudo, em que as pessoas não se comunicam, ou comunicam-se politicamente, em que vejo edifícios de Niemeyer sem que eles me enviem qualquer mensagem subliminar.

Acho os edifícios desenhados por Niemeyer puros, eles não querem impor conteúdos, permitem que sejam preenchidos por diferentes culturas, ideologias, grupos, ideias: são básicos, essenciais. Talvez não sejam funcionais, os edifícios. Mas são essenciais em suas linhas sintéticas e claras. Posso ouvir a música que quero ao olhar os espaços públicos de Brasília. E ouço Bob Dylan. E penso em JK, depois em JFK. E de novo em JK.

Disney

26 de outubro de 2009

Foi uma semana intensa, a Disney não é pra qualquer um. A gente se sente na cidade universitária, os parques são como as faculdades (a analogia é meio estranha, mais espacial que ideológica). É que as avenidas são largas e há verdes campos. Andamos de ônibus porque ficamos em um hotel dentro da Disney. Aí era muito fácil, os ônibus vinham e iam, a música que ouvíamos no caminho tinha a temática do hotel, Port Orleans Riverside. Se tivéssemos ficado no French Quarter as músicas provavelmente seriam francesas.

Tudo é falso na Disney, menos a Disney. A realidade é palpável: eles conseguiram criar um ambiente onde tudo- menos o calor e os quilômetros que andamos a pé- é agradável, simpático, amável e arriscado: no limite. Quando queria uma informação da telefonista do hotel, à noite, ela se despedia dizendo “have magical dreams”. E de manhã ela dizia “have a magical day”. Não me lembro de ter ouvido vozes masculinas atendendo telefone. Mas vi mulheres dirigindo ônibus; uma mulher, na verdade.

Nesses dias voei por montanhas de neve, mares, com o vento batendo no rosto e nos meus pés pendurados. Andei de avião, fui a Marte, a Atlanta, ao México, à África, à Ásia (não entrei no elevador assombrado e não enfrentei a montanha russa de ponta cabeça). Vi foguetes e almocei com um astronauta de verdade no Kennedy Space Center.

Vi a querida orca Shamu, os golfinhos, o Cirque de Soleil. Remy cozinhou pra mim, entrei no Japão e adquiri lindos adesivos japoneses e cartões postais de Hiroshige. Jantei com as princesas todas no castelo norueguês. Vi elefantes, girafas, tubarões malignos.

Os americanos estavam todos lá, gentis, amáveis, às vezes não, dependendo. Comi waffle com maple syrup quase todos os dias, quebrando a dieta de todos os dias. Sabia que o maple syrup é um xarope extraído de seiva de árvore? Pensei que fosse totalmente artificial, mas não é. Tomei iogurte, contrariando minha nutricionista preferida e nossa recusa à lactose.

Cheese cake e cookies, muitos cookies, entraram na minha alimentação. Nada concedi aos ovos e as lingüiças, no entanto. Havia cenourinhas e pepinos em caixinhas plásticas, mas quem ousaria? O máximo que admiti foram as pequenas uvas sem caroço, lavadas, que levava para o quarto. E morangos. Comi muito camarão, também.

Senti falta do Mickey e da Minie, não apareceram no meu caminho. Mas vi Alice no país das maravilhas e Mulan. O castelo da Cinderella estava impávido, mas não pudemos entrar, não entendi bem. E falei inglês, muito inglês. Poderia ter falado espanhol, mas deixei as palavras em casa. De manhã eu ficava confusa, trocava as frases. Depois ia melhorando.

Fiz pouquíssimas compras, fiquei nas lembranças de viagem e arrisquei uma máquina fotográfica. Não visitei outlets. Ouvi que as roupas americanas são resistentes (máquinas de lavar e passar) e baratas, mas gosto de comprar perto da minha casa e parceladamente. Em viagens não sou consumista.

Tenho dado muita risada desde que cheguei, mas já estou ficando preocupada outra vez. Ah, também adquiri um massageador de costas no aeroporto. Não passou no raio x, precisou ser verificado. Tudo bem, era um inocente objeto de consumo de uma brasileira mais tensa.

Sei que sobrevivi e ainda estou digerindo a diversidade experimentada, tão confusa e tão igual, na verdade. Fiquei com vontade de conhecer mais os Estados Unidos.

Lugares onde nunca estive

29 de julho de 2009

Embora já conheça a Escandinávia, boa parte da Europa, bastante do Brasil, nunca fui a alguns lugares meio óbvios e muito visitados. A Disney, em Orlando, Flórida, é um desses lugares. Tem gente que eu conheço que já foi até lá duas ou três vezes. Adultos amam a Disney. Ouço falar em parques temáticos, resorts de luxo, hotéis dentro e fora da Disney, aluguel de carros, gps nos veículos, castelo da Cinderela, jantar com o ursinho Pooh, Epcot, Sea World, Universal, montanhas russas de variadas formas e modelos,  como se tudo isso fosse uma coisa só e estivesse logo aqui na esquina.  E me pergunto como nunca fui lá. É que sempre achei caro, complicado e talvez  não merecido ir a um lugar onde a fantasia pudesse me desligar de minhas angústias tão comuns. Se eu for a lugares tão maravilhosos e sentir emoções tão fortes, o que mais poderei fazer? Aonde mais poderei ir? É bom deixar a Disney por último, para uma outra oportunidade, como uma estrela guia. Será isso? Pode ser que eu não tenha a menor vontade de conhecer a Disney e Orlando, pode ser que tudo aquilo me canse, que eu não goste de andar sob o sol escaldante e muito menos de ficar em filas, como ouvi dizer que ficam.  A verdade é: nunca fui à Disney. Também nunca fiz uma coisa que muita gente já fez: nunca esquiei. E nunca vi neve caindo. Já vi neve no chão, na Noruega e em Bariloche. Conheci Bariloche no verão e a paisagem é muito linda. Mas aquela coisa branca e fofa caindo eu não vi. Fui a um resort de neve quando não havia neve, na Noruega, e era como um clube no fim da festa, esquisito. Tenho essas duas frustrações, a de nunca ter visto neve e a de não ter visto a Disney. Talvez, mas só talvez, eu vá a Orlando ainda este ano. Agora a neve vou deixar guardada na imaginação,  porque pode ser que eu veja, e sinta muito frio.


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