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Entrevistas com escritores

17 de outubro de 2015

Se um dia me perguntarem o que coleciono, direi: entrevistas com escritores. Sempre gostei.
Em uma entrevista, o escritor pode dizer qualquer coisa porque a resposta nunca será checada. Não é uma informação que ele dá. É um estado de espírito, um devaneio, uma luz qualquer que pode iluminar outros escritores.
Não sei exatamente quem lê essas entrevistas, se são leitores ou escritores. Acho que os primeiros, já que os segundos gostam de mergulhar na ficção.
Gosto de ler entrevistas bem longas.
A Companhia das Letras publicou muitas da Paris Review (“As históricas entrevistas da Paris Review”, “As entrevistas da Paris Review”). São quatro livros (1988, 1989,2006, 2006).
No primeiro estão E.M. Forster, Dorothy Parker, Faulkner, Simenon, Pound, T.S.Eliot, Céline, Evelyn Waugh, William Burroughs, Saul Bellow, John Dos Passos, Borges, Isaac Bashevis Singer, John Cheever, Gore Vidal, Nadine Gordimer, Kundera.
Simenon disse que segue conselho de Colette: não escrever de um jeito muito literário e isso significa tirar do texto advérbios, adjetivos, “a frase que está lá só por si mesma”. Não revê o enredo, mas muda nomes de personagens e depois uniformiza. Tem sempre algumas ideias e, antes de começar a escrever, escolhe uma. Aí procura uma atmosfera (um sol, uma primavera). Uma cidade, personagens e um mundo se forma. E aquela ideia primeira se junta ao ambiente. E, com o problema, surge o romance. Um dos problemas recorrentes é o da comunicação. É trágico, para ele, que, entre milhões de pessoas, a comunicação completa é impossível entre duas delas. Outro é o da fuga: mudar de vida totalmente.
Eu me identifico com essa fala de Simenon. Também me interesso pela mudança de rumo na vida, pelo desaparecer das pessoas, por morte ou outro motivo. E a impossibilidade de comunicação completa, o não compreender o outro, me afligem.
Outra entrevista bacana é a de Milan Kundera. Diz muitas coisas interessantes, e uma delas é “todos os meus romances são variantes de uma arquitetura baseada no número sete”. Capítulos são independentes, como compassos de uma partitura musical: moderato, presto, andante. “A festa do adeus”, porém, tem cinco partes, assim como “Risíveis amores”. E ele diz mais: a verossimilhança não é necessária. A farsa é permitida. O divertimento é importante. Seus romances unem elementos heterogêneos (polifonia) e há também, em alguns, a farsa, que chega ao inverossímil.
Entre Simenon e Kundera não há nada em comum. Mas aprendo, com os dois, a respeitar meu próprio modo de imaginar situações e personagens, concretizando-os no mundo da ficção, que certamente existe.