Estive em Guiné-Bissau, país que está na costa ocidental da África, por uma semana. Foi pouco tempo.
Antes de ir, estudei. Comecei pela literatura e pelo magnífico livro de Moema Parente Augel, “O desafio do escombro” (Garamond, 2007), que me deu informações para compreender melhor a cultura da Guiné. Ela fala da história do país, da política, da literatura muito rica, dedicando-se bastante à língua. A oficial é o português, que se aprende na escola. Há, no entanto, o crioulo, ou a língua guineense, falada pela maioria das pessoas. E há ainda as línguas faladas no âmbito das etnias, que são muitas.
O crioulo é agradável de ouvir. Uma língua bonita. Quando falam entre eles, não dá para entender. É interessante que não possamos entender o que guineenses conversam quando não estamos incluídos. Não me sentia mal por não estar incluída. No livro de Moema há vários poemas escritos em crioulo traduzidos para o português. São lindos. Há vários da poeta Odete Semedo. Segue um verso, transcrito de “O desafio do escombro”:
Sou parte desta natureza
Tão gasta
Desta face da terra
Tão frágil e vasta
Sou o rio que corre
Tropeçando em pedras e vales.
Em crioulo:
Ami i padas di es mundu
Ku gasta dja
Ami i un burdu di n tera
Ami i iagu ku na kuri
Ku na n baransa nas pedras.
Em Bissau falei e ouvi português, língua aprendida na escola e usada nas comunicações oficiais. Fala-se bem a língua, mas com algum distanciamento, o que talvez transforme a emotividade das mensagens transmitidas.
Fiquei conhecendo a literatura de Abdulai Sila, li seu romance “A última tragédia” (Rio de Janeiro, Pallas, 2011). Vi na internet que em Bissau entraria em cartaz uma peça escrita por Abdulai (“Dois tiros e uma gargalhada”) e eu queria muito assistir, mas não deu: quando estreou, eu já tinha ido vindo embora. Uma viagem é feita também de lugares não visitados, de expectativas não resolvidas.
No Museu Etnográfico Nacional de Bissau aprendi sobre o pano de pente, tradicional. Presentear alguém com um pano é um ato de amizade e carinho. Comprei panos de pente em Bissau. Aprendi que até amanhã significa para sempre, ou que não há para sempre além de amanhã (tive um pouco de dúvida sobre o alcance da expressão).
E na literatura aprendi uma palavra antiga com significado novo: mantenha. Vi essa palavra pela primeira vez no livro de Abdulai Sila, em que o personagem se apresenta: “Vim só falar mantenha rápido. Eu sou o professor da escola”. (“A última tragédia”, p. 109). E todos tem a sua tabanca, a vila para onde podem voltar, onde está sua comunidade.
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Este blog que fala sobre Guiné-Bissau é bacana:http://montedepalavras.blogspot.com.br/ .
E mantenha quer dizer cumprimentos: http://montedepalavras.blogspot.com.br/search?q=mantenha