Poema que escrevi em 2019: dois quadros

 

um lugar pra onde vou de vez em quando

 

uma vez a cada três ou quatro meses

 

lá tem mar

e tudo o que sempre teve

 

objetos,  móveis, cadeiras de praia, as redes velhas e as novas

os brinquedos esquecidos

 

lá uma estante com livros velhos e conservados

revistas de culinária de 1998

revista com fogos de ano novo em 2000

 

marca de um quadro na parede

um quadro que não tenho mais

dei para uma amiga porque não conseguia olhar pra ele

foi pintado por uma vizinha

um sol, o mar, o guarda-sol de muitas cores

uma pintura cuidadosa

 

a pintora

uma moça que nunca mergulhava no mar

só tomava sol

não nadava

 

quando ela morreu eu não fiquei sabendo

quando soube que ela morreu já tinha dado o quadro de presente

eu não aguentava olhar pra ele e por isso dei

um quadro estático

aí eu quis ver de novo

lembrar como era

 

minha vizinha, com quem eu tomava um café de seis em seis meses,

que não entrava no mar embora tenha pintado uma marina,

não existe mais

 

nem ela e nem o quadro (pelo menos não na minha parede)

 

agora um quadrado vazio

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