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Listas

17 de junho de 2017

“Listas extraordinárias” (organizado por Shaun Usher, Companhia das Letras, 2016) é um livro curioso.

Na apresentação, o autor já diz: nós, humanos, não paramos de criar listas para organizar nosso mundo caótico. Ele colecionou listas de outras pessoas enquanto pesquisava para seu outro livro também interessante: “Cartas extraordinárias” (Companhia das Letras).

Gosto desse livro das listas porque  me aproxima de pessoas que admiro e não conheci e já morreram.

Há no livro listas bem bacanas, como o Código do Caubói, de Gene Autry (ator e músico country americano da década de 30). Entre os itens está o de que o caubói nunca deve ser o primeiro a atirar, não pode bater em um homem menor que ele e não pode tirar vantagem sem razão. Deve cumprir as promessas, falar a verdade, ser gentil com crianças, velhos e animais e respeitar as mulheres (p. 50).

Depois da lista de Gene Autry está a de Chrissie Hynde, dos Pretenders. São conselhos para jovens roqueiras. O primeiro conselho é: “Não se lamurie por ser mulher, não fale de feminismo, não reclame de discriminação sexista. Estamos todas por baixo e fodidas, mas ninguém quer ouvir choradeira. Componha uma canção meio disfarçada a respeito disso e ganhe muito ($)”. O último conselho é: “Não aceite conselho de gente como eu. Faça sempre o que bem entender” (p. 51).

Woody Guthrie, músico que inspirou Bob Dylan, tinha, entre as decisões de ano novo: trabalhar com planejamento, manter a máquina da esperança funcionando, amar o pai, a mãe e todo mundo, ouvir muito rádio, tomar banho, fazer a barba, dançar melhor, entre outras lindezas.

Eu poderia me perder aqui nessas listas, são uma delícia de ler. Umberto Eco também tem um livro sobre listas que vale muitos textos (A vertigem das listas); ele acreditava na força delas, dos dicionários, das enciclopédias.

Tenho as minhas listas, só que escrevo em lugares diferentes, às vezes em cadernos, às vezes em aplicativos do celular tipo pocket, inkpad, evernote (preciso fazer listas dos lugares onde guardo listas). Faço listas de assuntos para escrever no blog, das canções preferidas de Bob Dylan, de coisas para arrumar em casa, prioridades burocráticas, ideias para contos, nomes de personagens. Não faço listas de despesas para não me incomodar, e nem de compras.

Estou aqui pensando nas minhas listas :

1)- Livros que gostaria de ter escrito: O irmão alemão e Budapeste, ambos de Chico Buarque.

2)- Filmes prediletos: Esposamante (Marco Vicario) e Aproximação (Amos Gitai). Vários outros.

3)- Canções: Retrato em branco e preto (Tom Jobim e Chico Buarque),  Paint it black (Stones), A simple twist of fate (Dylan), quase todas de Caetano, Feio (Primos distantes).

4)- Cidades: São Paulo, Berlim e Roma.

5)- Autoras preferidas que já morreram: Gertrude Stein, Karen Blixen e Janete Clair.

6)- Autoras preferidas brasileiras: todas, mas rendo minhas homenagens às minhas amigas do Coletivo Literário Martelinho de Ouro.

7)- Autores preferidos que já morreram: Lima Barreto, Oswald de Andrade, Tolstoi, Cortázar, Hemingway, Fitzgerald.

8)- Autores preferidos brasileiros: todos, seja escritor, seja herói (lembrei de Oiticica, aqui).

9)-Cores preferidas: azul, vermelho e amarelo.

10)- Flores preferidas: rosa, rosa e rosa.

O problema de publicar a lista é que dá um frio na barriga, tipo: quanto essa lista revela de mim?

Às vezes, nada, porque a gente pode mudar, inverter a ordem, fazer outras listas, completar as que se acham prontas, como acabei de fazer agora. 

Listas organizam em um momento, mas também são aleatórias.

Este é um texto que nunca darei por terminado.

 

Festa de Literatura para Lima Barreto

4 de junho de 2017

 

desenho de como vai ser a Flip em Paraty

 

Ah! A literatura me mata ou me dá o que peço dela.

Essa frase é de Lima Barreto em “O cemitério dos vivos”. Ouvi de Joselia Aguiar, curadora da Flip, na Coletiva de imprensa à qual tive  o prazer de assistir dia 29 de maio.

Logo no começo da manhã Joselia falou essa frase que na hora  me fez ficar muito ligada em seu discurso muito claro e detalhado. Ela não falou só sobre o programa, mas abriu caminhos para novas ideias. Tanto que cheguei em casa e fui procurar, já que ainda não tinha lido “O cemitério dos vivos”, onde a frase está.

Anos depois de sua morte a literatura retorna a Lima Barreto e dá a ele, em mesma oportunidade, leituras, reflexões, debates, encontros. A Flip 2017 confere  ao grande autor brasileiro toda reverência, expondo ao público, por meio de iluminada programação, a atualização e a atualidade de sua obra e de muitas outras que com ela se relacionam.

A Flip 2017 tem em sua programação mais mulheres que homens e pelo menos 30% de participantes negros. Joselia disse que a questão racial é importante, mas não aprisiona o diálogo. Os artistas querem ter a liberdade de falar sobre arte, ciência,  assuntos diversos.

A liberdade é nosso maior bem,  destacou Joselia, e foi importante na escolha dos assuntos e das mesas, escolha essa concentrada em mostrar autores novos que não estão nos centros, mas nas margens.

A liberdade é essencial na obra de Lima Barreto, valendo ressaltar, sobre o tema,  artigo de Lilia Schwarcz  publicado no último 13 de maio (http://www.blogdacompanhia.com.br/conteudos/visualizar/13-de-maio-Liberdade-hoje-e-seu-dia). Lilia Moritz Schwarcz estará na abertura da Flip e terá lançado, até lá, a biografia “Lima Barreto: triste visionário”, pela Companhia das Letras.

Na programação da Flip estão autoras de quem já gosto: Ana Miranda, Conceição Evaristo, Maria Valéria Rezende, Natalia Borges Polesso. Entre os homens está Alberto Mussa, admiro bastante da escrita dele. É bom que a programação conte com  autoras e autores que não conheço e virei a conhecer, o mundo literário é infinito, sempre surpreende.

Para mim a Flip já começou. Não sei ainda se vou a Paraty. Mas já estou no movimento de buscar novas escritas, de pesquisar  textos de Lima Barreto que nunca li. Leio sempre “Recordações do Escrivão Isaías Caminha”, adoro esse romance.

Os primeiros dois capítulos e metade do terceiro de Recordações foram publicados, primeiro, na  Floreal, revista que Lima Barreto fundou em 1907 e só chegou ao quarto volume. Depois, o romance foi publicado por editora portuguesa (encontrei os exemplares da Floreal digitalizados na página da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin na internet).

Em carta a Gonzaga Duque, o próprio Lima Barreto afirma: “Mandei as Recordações do Escrivão Isaías Caminha, um livro desigual, propositalmente malfeito, brutal por vezes, mas sincero sempre” (Correspondência, I, pp 169-170, citada por “A vida de Lima Barreto”, Rio de Janeiro, José Olympio, 2002, p. 184).

Uma de minhas características prediletas do livro “Recordações do escrivão Isaías Caminha” é essa imperfeição destacada pelo próprio autor.

Gosto quando, na ficção, a linguagem não é barreira entre o leitor e o texto. Fica tudo claro e posso pensar no que o autor está contando ou dizendo, fazendo minhas próprias associações e analogias e confrontos.

O romance, em seu estilo muito direto,  só renova a compreensão sobre a hipocrisia em suas diversas formas.

Um autor perfeito como Lima Barreto, que admite ter escrito de modo imperfeito, só pode esperar o máximo da literatura.

*****

Insiro aqui alguns links de textos interessantes que encontrei na internet sobre Lima Barreto:

http://www.blogdacompanhia.com.br/conteudos/visualizar/13-de-maio-Liberdade-hoje-e-seu-dia

http://seer.fclar.unesp.br/estudos/article/viewFile/1047/863

Clique para acessar o anais_105_1985.pdf

http://www.revistas.usp.br/teresa/article/viewFile/99461/97948

http://seer.fclar.unesp.br/estudos/article/viewFile/1047/863

Clique para acessar o 1444.pdf

Clique para acessar o gt_lt13_artigo_6.pdf

https://pendientedemigracion.ucm.es/info/especulo/numero18/limabar2.html

http://www.filologia.org.br/viiicnlf/anais/caderno13-17.html

Clique para acessar o coracao-claudio-resistencia-missao-solidariedade.pdf

Clique para acessar o 035855-1_COMPLETO.pdf