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David Bowie em seus 66 anos: aí lembrei de Caetano

10 de janeiro de 2013

bowieEssa semana surgiu na internet um vídeo do David Bowie, que vai lançar novo álbum. O link, da Folha de São Paulo, segue aqui: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/1211591-david-bowie-lanca-single-e-anuncia-primeiro-album-em-dez-anos.shtml.

“Where are we now?” É o título da música. O clip é estranho porque começa em um lugar que é como uma oficina da memória, com objetos meio que quebrados, espalhados, desmontados, fragmentados, distribuídos. E em uma tela passam cenas de Berlim, cidade onde, segundo a matéria da Folha, ele viveu entre 76 e 79.

As imagens de Berlim são lindas e a letra da música, que  aliás aparece no clip, fala de Berlim. E nessa tela estão os rostos de Bowie e de uma moça, só os rostos, encaixados em corpos de bonequinhos de pelúcia sentados. Os rostos estão inseridos na tela. Os rostos aparecem em buracos como aqueles em brinquedos de festas populares, em que posamos, para fotografias, em corpos de outros seres, personagens, pessoas.

Está sendo um exercício e tanto narrar o vídeo, porque é quase indescritível. São tantas as ideias e informações e sugestões que seriam necessárias conferências para as reflexões decorrentes. Mas posso sintetizar assim: é David Bowie em seus 66 anos.

Inspirada pelo vídeo, enquanto o álbum não sai, ouvi, em vinil, Diamond Dogs e Tonight. Tenho vinis do Bowie comprados quando eram novos. Se bem que Diamond Dogs comprei já usado, em alguma feira, não me lembro bem.

Gosto demais de David Bowie, diria que ouço talvez até mais que Dylan, mas, enquanto o último é muito familiar, Bowie é sempre distante. Parece que Bob Dylan faz tudo meio de improviso e David Bowie prepara mais, e com isso se distancia do ouvinte. A beleza de David Bowie é inatingível. Não sei bem porque comparo os dois, acho que é porque gosto muito e fico tentando saber de qual gosto mais. Sei lá.

A música do clip me lembrou um pouco a música “Estou triste”, de Caetano, do Abraçaço. A canção de Caetano colou em mim e lembrei de “Where are we now?”, de Bowie. A tristeza é um sentimento bastante contemporâneo. Algumas épocas têm sentimentos que marcam.

Ouvi agora o Abraçaço de Caetano e a canção “A boca nova é foda” é foda. Todo o Abraçaço é muito bom. Como o Caetano escreve bem.

caetano

Perfil de Dylan

6 de novembro de 2012

Bob Dylan – Blonde on Blonde

Em 1966, Bob Dylan sofreu acidente de motocicleta em Woodstock. Não se sabe bem, até hoje, se ele se machucou muito, pouco ou quase nada. Houve boatos em todos os sentidos. Seu empresário tinha marcado 64 shows nos Estados Unidos – que ele não fez. Voltou às turnês só em 1974. No meio tempo, participou do festival da Ilha de Wight em 1969 e do Concerto para Bangladesh em 1971. Há, na internet, em Dylanesco (http://dylanesco.com/drifters-escape-o-acidente-de-1966), informações bem completas sobre o acidente.
Bob Dylan era sempre muito pressionado, cobrado por ter adotado a guitarra elétrica e transformado, em rock, a música folk que o levara ao sucesso. Era cobrado por ser político, por negar a política, por falar o que pensava, por não falar nada. Não parecia se incomodar muito. Sempre fez a música que quis.
Na introdução ao livro Bob Dylan: The essencial interviews, (Wenner Books, New York, 2006), Jonathan Cott, editor, observa que a frase de Rimbaud, “I is another” (Je est un autre, ou Eu é um outro), define o músico. Quem acompanha a carreira de Dylan sabe que não há nada mais verdadeiro. Ele é, todo o tempo, ele mesmo, ele e outro, ele e eu, nós, você, todos. Sua identidade está sempre se desfazendo. Sua música desfragmenta o tempo.
Declarou, certa vez, ao repórter da Newsweek, David Gate, que não seria uma pessoa tangível, mas mutante: acordava um e dormia outro. Outra característica sua é a de não remoer equívocos: pensa sempre no que está por acontecer. Assume tudo o que faz, seja bom ou ruim. E é conhecido e reconhecido como gênio, visionário, poeta.
Embora as canções de Dylan sejam extremamente discursivas, longas, repletas de imagens complexas, até mesmo proféticas, não ensinam nada a ninguém. Muitas delas foram cantadas na defesa de direitos humanos, como “Masters of war”. Mas o músico sempre negou a militância explícita.
Ao receber o prêmio de direitos humanos Tom Paine em 13 de dezembro de 1963, Dylan fez declarações inusitadas. Disse que não pensava em política e que via algo dele mesmo em Lee Oswald, que matara o presidente Kennedy pouco tempo antes (No Direction Home, de Robert Shelton, p.287). Foi vaiado, o discurso foi considerado ultrajante e ele se ofereceu, inclusive, a devolver o prêmio. Explicou, depois, que não elogiara o assassinato de Kennedy, mas falara em Oswald como reflexo de uma época. E que simplesmente não queria fazer parte de organizações e grupos.
A relação de Bob Dylan com a imprensa sempre foi muito complicada. Ao não aceitar o papel de formador de opinião, deixou de responder assertivamente a perguntas de repórteres em diversas entrevistas. Era vago, irônico, ou sincero demais. Em uma das cenas do filme de Martin Scorcese (No Direction Home), ele mesmo retrata, com sua própria câmera, jornalistas que o fotografavam, invertendo papéis. Outra vez, em 1965, em entrevista coletiva em Los Angeles, disse: “Estou apenas tentando responder às suas perguntas como você é capaz de fazê-las” (Robert Shelton, No Direction Home, p. 400). Também: “Eu não preciso explicar meus sentimentos! Isso aqui não é um julgamento!” (p. 401). Definiu-se como um artista do entretenimento. E só.
Artista do entretenimento, sem dúvida. Mas também um músico que se renova sempre, distorcendo e recriando as próprias canções, como mostrou em recente show em São Paulo (2012). Algumas músicas pareceram outras. Mas ”Ballad of a thin man” e “Like a rolling stone”, cantadas por um outro Dylan, que tem voz mais grave do que quando as compôs, emocionam sempre e uma vez mais.
Seu último disco, Tempest, lançado em setembro, tem sido elogiado por fãs e críticos. O CD gerou certo debate sobre citações, nas canções, de frases do poeta Henry Timrod e do escritor japonês Junichi Saga, sem indicação da fonte. E, mais uma vez, Dylan polemizou: se não fosse ele, ninguém saberia da existência de Henry Timrod. E mais: na escrita das canções, importam ritmo e melodia: vale tudo.
Em tempos em que a comunicação é regida pela internet, debates em torno de direitos autorais são os mais acirrados. As declarações de Bob Dylan fazem pensar. Depois de 50 anos de carreira, acompanhando e adiantando-se a novos tempos, sendo, sempre, um outro, Dylan continua fazendo política. Querendo, ou não.

How does it feel?

1 de maio de 2010

Sou fã do Bob Dylan e não podia deixar de ter “Like a rolling Stone: Bob Dylan na encruzilhada”, de Greil Marcus (São Paulo, Companhia das Letras, 2010). Tenho até dois exemplares, comprei o segundo pra dar de presente, numa eventualidade.
A música está logo no começo do livro: Once upon a time you dressed so fine…E a tradução está ao lado, de Eduardo Bueno. Ele traduziu a primeira frase por Era uma vez uma garota bem- vestida. Estranhei a tradução, a palavra garota não ficou bem porque quando Bob Dylan canta, parece que está falando com a gente, com você, e a inserção de uma terceira pessoa na letra tira toda a graça. Não adianta, a música fica bem em inglês, mesmo que não dê pra entender tudo.
O livro é um pouco confuso, escrito na primeira pessoa, mas muito sério e preocupado em analisar a música em seu contexto eminentemente americano. Não vai dar pra ler tudo. É incrível como os livros sobre Bob Dylan podem ser herméticos. Este nem é tanto, já vi piores – ou melhores. Só que tive a impressão de que quem lê não chega a lugar nenhum, as inúmeras informações não deixam o autor contar uma boa história da canção, se é que ela existe (a história). Bom mesmo é ouvir a música.

Brasília e Bob Dylan

1 de dezembro de 2009

Brasília e Bob Dylan têm alguma coisa em comum, pra mim. É que no avião ouço Bob Dylan e quando estou na capital geralmente estou sozinha e no hotel  sou eu mesma e nessas ocasiões geralmente  penso em algumas músicas vitais: Visions of Johanna, A simple twist of  fate , Like a rolling stone, Desolation row, Ballad of a thin man, Highway 61 revisited. Essas são as músicas que eu mais gosto. Gosto de Jokerman, também, mas Jokerman está em um cd que não ouço tanto. Ouço muito  Highway 61 revisited (1965), Blonde on blonde (1966) e  Blood on the tracks (1974).

Brasília é uma cidade da década de 60, foi inaugurada em 1960. Quando Bob Dylan gravou  Highway 61 revisited, a cidade tinha cinco anos. JK foi um presidente visionário, concretizou um sonho que parecia impossível. Em uma das vezes em que estive lá, comprei sua biografia. Está separada, vou ler antes da biografia de Walt Disney. Quando um lugar me impressiona, gosto de ler sobre quem o criou. Por isso tenho a bio de Disney, também.

E tenho livros sobre Bob Dylan, embora  ele não tenha criado uma cidade. Mas criou inúmeros espaços mentais e sonoros; ele construiu, com sons e palavras,  caminhos que levam as pessoas a assumirem identidades e diferenças. Para Bob Dylan, suponho, não existe a igualdade ideológica entre as pessoas. Penso que ao descobrir isso ele se desligou da tentação dos discursos políticos e ativistas. Não sei. Não gosto de teorizar, de estabelecer pensamentos dogmáticos. Ele também não. Em dezembro de 65, deu uma entrevista coletiva famosa em que  negou, ou ignorou, que suas canções pudessem ter mensagens. Para ele, não são folk songs,  considerando-se que ele mesmo definiu folk music “as a constitutional re-play of mass production” (Television Press Conference, KQED, em Bob Dylan:The essential interviews).

Mas o que Brasília tem com  tudo isso? Tem no meu espaço mental. A cidade é aquele branco que fica separado de tudo, em que as pessoas não se comunicam, ou comunicam-se politicamente, em que vejo edifícios de Niemeyer sem que eles me enviem qualquer mensagem subliminar.

Acho os edifícios desenhados por Niemeyer puros, eles não querem impor conteúdos, permitem que sejam preenchidos por diferentes culturas, ideologias, grupos, ideias: são básicos, essenciais. Talvez não sejam funcionais, os edifícios. Mas são essenciais em suas linhas sintéticas e claras. Posso ouvir a música que quero ao olhar os espaços públicos de Brasília. E ouço Bob Dylan. E penso em JK, depois em JFK. E de novo em JK.