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Três leituras de 2014

22 de dezembro de 2014

praiareduzida

 

Vou falar agora de três  livros que li em 2014:

1)- “Memórias sentimentais de João Miramar”, de Oswald de Andrade (Globo). Não tinha lido ainda e adorei, principalmente por ter sido escrito em tópicos numerados.

E há uma introdução de Haroldo de Campos, sob o título Miramar na mira,  que é bem legal. Ele fala da estética do fragmentário, que Mallarmé explicaria como “destruição da frase em fragmentos”, descontinuidade em lugar da ligação” (p. 30).

Não vou sintetizar aqui a introdução ao livro de Oswald porque seria cansativo demais, mas posso dizer que li o livro antes de ter lido a introdução e tive o sentimento de que as Memórias sentimentais ainda  são futuristas. Li um texto que poderei ler em dez ou vinte anos e ainda assim será inspirador.

Os parágrafos numerados são curtos e misturam cidades, palavras em outras línguas, ideias, estilos, pessoas. Está próximo de Joyce, como diz a introdução, e é mais sintético, por outro lado, o que é muito bom.

Textos curtos e que dizem muito são valorosos nos tempos de hoje, embora a edição de  livros longos, como “Graça infinita” de David Foster Wallace, recém publicado pela Companhia das Letras, por exemplo, possam mostrar o contrário.

2)- “Amarração”, de Renato Rezende (Circuito).  Não conhecia os romances de Renato Rezende,  super  poeta, também. Ele é editor da Circuito, que publicará  meu romance policial “Nove tiros em Chef  Lidu” em 2015.

A Circuito publicou livro de Luiz Bras, “Pequena coleção de grandes horrores”, e foi assim que conheci.

Li em 2014, de Renato Rezende,  “Amarração”, “Aureola” e “Caroço”, romances que fazem parte da trilogia da fantasia. Em “Amarração”, o personagem conta trajetos, pensamentos,  relacionamentos amorosos,  expõe indagações de quem sabe que vive no risco, porque a vida é sempre um risco, mesmo quando não se faz nada. Mas acontecem coisas no livro, os encontros são variados e diferentes.

O espaço do livro é o Rio de Janeiro (a Índia está, também) e o mar volta e meia aparece, como aqui: “O mar estupendo, o mar que será o mesmo no milênio que virá; o mar indiferente e repositório de nossas lágrimas todas, mar do Arpoador às seis da tarde de um dia de verão, entre sacos e copos plásticos e eternos palitos de sorvete” (p.49).

(Eu também gosto do mar, sem ele eu não seria eu. Moro em São Paulo, mas vou sempre a Ubatuba, onde o mar é lindo, e nasci em Santos, onde o mar é diferente, denso, com muitos navios, e igualmente lindo. Gosto dos mares de Santos e de Ubatuba, que conheço melhor e posso chamar de meus).

E a narrativa fala do corpo como limite da existência, também, e isso é bem legal no livro.

3)- “David Copperfield”, de Charles Dickens (Cosac Naify). O livro é imenso, a edição da Cosac tem 1243 páginas (sem contar os textos críticos), é integral. A tradução de José Rubens Siqueira está muito boa, mantém o estilo de Dickens.

Li com total encantamento. A ironia da narrativa, a perspicácia do personagem, mesmo criança, diante das dificuldades da vida, me deram vontade de escrever cada vez mais. O narrador está na história, mas consegue ser um observador de si mesmo,  é muito interessante a maneira como David alcança o distanciamento para contar mantendo, ao mesmo tempo,  a subjetividade. Eu leio sempre pensando na escrita. Um livro, para mim, é bom  quando me faz querer escrever. Ler e escrever são quase que uma coisa só, fazem parte de um mesmo processo. Não que eu não mergulhe na história. Fico totalmente entretida. E com vontade de escrever.

Dickens caracteriza ambientes e personagens com naturalidade, cheguei a vê-los, a conhecê-los. Vi Londres, também, descrita com poucas palavras e frases, a partir das quais visualizei a cidade com quase exatidão.

O livro pode ser examinado sob vários aspectos, mas me chamou atenção a maneira como a amizade surge, a amizade que enriquece as pessoas, e a amizade que enfeitiça, também. A edição da Cosac está super bem cuidada e acrescida de textos críticos, entre os quais um de Virginia Woolf, assim como de cronologia. É uma edição importante. Os clássicos tornam-se contemporâneos quando publicados com atualidade. A edição da Cosac tornou o livro  instigante, achei.

Em 2015 quero ler muitas biografias. Listo algumas: Neil Young, Stephen King, Raymond Chandler, Chagall, Tolstoi, Patricia Highsmith.

 

Literárias e Ubatuba

16 de maio de 2012

Literatura e Ubatuba têm muito ou pouco em comum. Passei domingo lá e o dia estava lindo de tão feio. Ninguém na praia. Quer dizer. Passou um carro na areia, uma caminhonete. Eu andando e aquele carro grande vindo na minha direção. É proibido, quis gritar. E se ele me atropelar? Não resisti ao pensamento. Fui para o canto. Primeiro para a beira, no mar. Depois para a beira, na grama. Ele continuou devagar. Mas que impulsos não pode ter  um motorista de caminhonete dirigindo na areia em uma praia longa e absolutamente vazia, com exceção de uma caminhante solitária? No dia das mães? Ficções.

E a Virada Cultural. Marcelino Freire e Evandro Affonso Ferreira na Casa das Rosas. Às 2 da manhã. Amigos. Divertidos. Profundos. Complexos. Literatura.

E Valter Hugo Mãe na Livraria da Vila, Fradique, 12 de maio.  Valter Hugo Mãe é legal. O discurso dele é sedutor. Fala bem, pensa bem, vai direto no coração. Atinge. Daniel Benevides, da Cosac Naify, ciceroneou, recebeu, coordenou, fez as perguntas. Ele é muito inteligente.

Leituras: Haruki Murakami. Minha querida Sputnik e Do que eu falo quando falo de corrida. Eu queria escrever como Murakami. Queria correr como Murakami.

James Wood: Como funciona a ficção (Cosac Naify)

26 de novembro de 2011

Fui ao Clube de Prosa da Cosac Naify na Livraria Cultura em 23 de novembro. O livro escolhido: Como funciona a ficção, de James Wood, publicado pela editora  em 2011.

O mediador,  Daniel   Benevides,  estava super bem preparado. Falou sobre James Wood, crítico americano que escreve para a New Yorker e já publicou outros livros.

Pena que precisei sair mais cedo. Até o momento em que fiquei, a conclusão era a de que o livro desmistifica leitura, aproximando livros e pessoas.

É verdade. E o livro é importante, também,  para quem escreve e quer escrever mais e melhor. Gosto de ler a parte em que ele fala da  personagem de ficção.

James Wood reflete sobre  Jean Brodie, personagem criada por Muriel Spark,  que nunca li. A Srta. Brodie é uma professora que aparece por meio de seus alunos. Olha só: “Ao reduzir a Srta. Brodie a uma simples coleção de máximas, Spark nos obriga a virar alunos de Brodie. No decorrer do romance, nunca deixamos a escola ou vamos para casa com ela. Nunca a vemos em sua vida particular, fora de cena. A Srta. Brodie é sempre uma personagem em ação, mantendo uma face pública. Supomos que há alguma frustração e mesmo certo desespero nela, mas a romancista nos nega  acesso ao interior do personagem” (p. 107).

Fiquei curiosa para conhecer Muriel Spark e a Srta. Brodie. Mesmo sem ler The prime of  miss Jean Brodie,  já gosto da Srta. Brodie.

Agora essa frase de James Wood – Spark estava profundamente interessada no quanto podemos conhecer de alguém –  refere-se, no meu ponto de vista, ao assunto principal da literatura.

Segue link para texto de Daniel Benevides sobre o livro no blog da Cosac: http://editora.cosacnaify.com.br/blog/?p=9946.