Quem escreve está concentrado na transformação, em palavras, dos sentimentos que as imagens provocam. Fotografias, retratos, filmes, passam. É impossível registrar tudo. O esforço para memorizar cansa.
O inconsciente guarda em algum lugar.
(aí eu, pelo menos, me pego, muitas vezes, tentando lembrar onde guardei tal livro, tal documento, tal recibo, ideia, informação. E me perco em mim. Procuro em gavetas, arquivos de computador, cadernos, recortes de jornal, bolsas, revistas, no meu cérebro. Até achar. E em algum momento encontro. E começo a procurar outras coisas. Tenho tentado sossegar com as informações inexatas ou mesmo perdidas).
As imagens não se transformam, imediatamente, em narrativa. Elas precisam de um tempo; ou a gente precisa de um tempo.
A comunicação, hoje, é, preponderantemente, visual. É raro assistirmos a conferências ou palestras sem power point. Os slides dão segurança ao orador e ao espectador. Não faz mal se a gente não captar tudo: estará escrito. A informação foi registrada e não precisamos prestar tanta atenção. Um slide em power point é imagem de escrita. Acho que por isso as pessoas gostam tanto de fotografar em museus. Para possuir a imagem, ficar com ela, ver melhor depois, um dia, se tiver tempo.
No Whitney Museum, em Nova York, está um dos trabalhos de Jasper Johns sobre a imagem da bandeira americana (Three Flags) e a legenda explica que, por volta de 1950, ele começou a usar símbolos conhecidos (alvos, letras, a bandeira americana), ou, em suas palavras, “things the mind already knows”.
Achei tão interessante isso que fui procurar e descobri, tanto na página do Whitney Museum, como na página do Metropolitan na internet, explicações mais detalhadas que indico aqui: http://www.metmuseum.org/toah/hd/john/hd_john.htm, http://whitney.org/WatchAndListen/Artists?play_id=677.
O vídeo da página do Whitney é bárbaro porque a explicação está na linguagem de sinais, com legendas. Aí não ouvimos, mas vemos e lemos, processando a informação de uma maneira estritamente visual.
Fui à exposição de Jasper Johns no Tomie Ohtake, em São Paulo (http://www.institutotomieohtake.org.br): Pares, Trios, Álbuns.
Os alvos, as letras, estão todos lá, the things we already know. Ele desconstrói o discurso, assim como Bob Dylan desconstrói a música, não sei se posso juntar essas ideias, mas acho que sim. Até hoje penso nos cabides de Jasper Johns (Coat Hanger I, Coat Hanger II). Por que fiquei tão impressionada com aqueles cabides?
Aí me ocorreu dar uma olhada no livro de Alberto Manguel (Lendo Imagens, Companhia das Letras). Ele se pergunta: “Qualquer imagem admite tradução em uma linguagem compreensível, revelando ao expectador aquilo que podemos chamar de Narrativa da imagem, com N maiúsculo?”
Eu não sei se essa pergunta tem resposta e acho que nem ele mesmo sabe. Mas ele tenta e escreve sobre a leitura de imagens.
É claro que ele não conclui muita coisa, e nem se propõe a tanto. No fim, é como ele mesmo diz, ao terminar o livro: “De todo modo, tais reduções não oferecem explicações nem pistas sobre o que se constela em nossa mente quando vemos uma obra de arte que, implacavelmente, parece exigir uma reação, uma tradução, um aprendizado de algum tipo – e talvez, se tivermos sorte, uma pequena epifania. Essas coisas parecem estar além do alcance de quase qualquer livro, e com certeza deste, feito de notas ao acaso e de indecisões” (p. 316).
E agora volto às minhas anotações de viagem a Nova York, aos folhetos que guardei, ao Whitney Museum.
A exposição Sharon Hayes: “There’s so much I want to say to you”, é interessante. Por meio de imagens e vídeos, capas de discos de vinil, são mostrados o que ela denomina “speech acts”. Recortes de movimentos sociais são apresentados de maneira que ultrapassa o jornalismo. O que me chamou a atenção foi a frase, there’s so much I want to say to you. Penso na incomunicabilidade coletiva e na individual, também. Poucas vezes falamos e escrevemos o que verdadeiramente importa. There’s so much I want to say.
Tags: Alberto Manguel, Coat Hanger, imagens, incomunicabilidade, Jasper Johns, Sharon Hayes, There's so much I want to say to you, Tomie Ohtake, Whitney Museum
Deixe um comentário